sexta-feira, 29 de abril de 2011

Warhol e o cinema: arte ou lixo?




Para entender o cinema como atividade de experimentação com legado e influência direta para as produções atuais e, conseqüentemente, para o surgimento das inovações visuais que são testadas em videoclipes, por exemplo, é importante ressaltar a obra cinematográfica do artista plástico Andy Warhol.
Nos anos 60, Warhol já era conhecido pelo visual excêntrico de dândi entediado, bem como por suas obras de pop art como a famosa sopa de lata da Campbells. Outra marca do artista era a reprodução em cores saturadas de retratos de celebridades como Marilyn Monroe, Elizabeth Taylor e Elvis Presley. Warhol ambicionava questionar o “valor” e a estética das artes plásticas.




O começo do artista foi na publicidade, onde ganhou fama. Depois passou a se diferenciar de outros pares da vanguarda americana ao ter como base em seu trabalho a abordagem cínica em relação ao consumismo americano. Por isso, Warhol desenvolveu uma idéia de “industrialização” da arte como forma para romper com os padrões estilísticos do gênero. Isso possibilitava, segundo ele, trazer novos conceitos para a produção artística elevando o kitsh da cultura de massa como produto de arte.
Uma das principais características de sua criação na década da contracultura dos anos 60 foi reunir diferentes formas de expressão em um único conceito. De certa forma, inovou ao criar eventos multimídia, isso muitos “anos luz” da profusão da Internet. Criações como o Exploding Plastic Inevitable (happening com diferentes manifestações artísticas unidas em uma proposta radical de comunicação marginal), são a gênese da idéia da cultura multimídia com pretensões de arte pop.

Andy e o Velvet Underground


O evento era a união de teatro, poesia, música, exposição de obras de arte e cinema.  Apadrinhando o grupo Velvet Underground, liderado por Lou Reed, a banda fazia a apresentação musical do Exploding com cenas de filmes de Warhol sendo projetadas sobre o fundo do palco. Vendo o sucesso da beatlemania e do rock como linguagem cultural da juventude, Warhol não tardou em se aproveitar da cultura do rock como forma de arte. Ao dar a “alma” que o grupo necessitava - leia-se a estética suja e obscura das canções, com letras provocadoras que abordavam temas pesados como drogas e sadomasoquismo -  ele estava colocando em evidência um rock que seria tão influente quanto o dos Beatles. Hoje, passados mais de 40 anos, fica comprovado em gêneros e tribos surgidas como os punks, góticos, darks, clubbers, entre outros.
No entanto, a ousadia maior de Warhol surgiu no cinema. Experimental como poucos, ele conseguiu subverter o cinema realista feito na França e Itália, chegando numa ruptura total desses elementos em voga naquele período. Em termos de cinema de vanguarda, ele filmou com devoção o universo fútil e vicioso das pessoas que o rodeavam (artistas plásticos, modelos, atores e celebridades), como também procurou destruir com todos os conceitos e mitos ligados à sétima arte, como aponta o jornalista Antonio Querina Neto.

[...] com seus diálogos inconseqüentes, sua proposital esterilidade de narrativa e outros “defeitos” deliberados (granulação elevada, buracos, pedaços queimados, misturas de sons de fora e de dentro do campo de visão) é uma afronta divertidíssima (como tudo que ele fez) aos cânones da arte convencional. [1]

A filmografia do artista plástico é um exemplo disso: do tedioso voyeurismo silencioso de filmes como Empire (1964) onde Warhol filma por oito horas o 44° andar do Empire State Bulding a closes abusivos em seqüências lentas e enfadonhas de beijos como em Kiss (1963) ou nas “caras e bocas” de um jovem supostamente recebendo sexo oral em Blow Job (1963). Isso sem falar nos filmes com roteiros absurdos como Space (1965) que desestrutura com o conceito de “interpretação” ao mostrar atores lendo cartões que lhes indicam o que devem fazer.
A ousadia do diretor durou até 1967 quando já dividia o cargo de diretor com Paul Morrisey. Depois dessas obras, os filmes do artista passam a contar com um formato mais tradicional e linear, almejando um retorno mais comercial. O próprio Warhol, após sofrer uma tentativa de homicídio pela ex-atriz de seus filmes Valerie Solanas, em 1968, deixou o lado provocador de sua arte e participou de forma ativa do “star system americano”. Um exemplo é a revista Interview, em que ele mitificava celebridades, nada que uma Caras da vida não faça.

Andy no set de filmagem


 Contudo, a experiência cinematográfica de Warhol foi tão impactante e influenciadora como suas obras em outras áreas mídiáticas. O caráter transgressor, tal a desconstrução dos paradigmas do cinema em seus curtas e longas, podem ser considerados como genitores da estética de “televisão de videoclipe” da MTV, a partir do início dos anos 80. 



Basta conferir a não linearidade e os aspectos surreais das vinhetas da emissora. Outra influência percebida nos dias atual é a expansão de produções amadoras que se proliferam como vírus no site de compartilhamento de vídeos You Tube. Ali pululam obras em diferentes formatos e gêneros, mas todas com a idéia fixa de filmar o banal do cotidiano, passando assim a “endeusar” o fugaz através das câmeras e de outros utensílios advindos do acesso irrestrito à tecnologia. 
O que se vê em Warhol e nos “filmezinhos” amadores na Internet é o mesmo ideal: romper com a convenção tradicional do cinema clássico, promovendo o universo que há ao redor do “diretor”. Essa relação ocorre com o voyeurismo de quem assiste aos vídeos, que é o mesmo de quem capta a realidade através de uma câmera, máquina digital e até mesmo de telefones celulares. Portanto há uma quebra de paradigmas, afinal Warhol propõe que qualquer um é um emissor de informação e que a “hierarquia” desta produção de sentido está alterada, nada mais verdadeiro do que a relação atual do homem com a internet.



            Assim, Warhol e o You Tube, por exemplo, provocam o mesmo questionamento ao testar limites do que é concebido e institucionalizado como “arte”: É cinema um filme que apenas capta a imagem de um arranha-céu em uma grande cidade? É cinema uma produção amadora feita com um celular tendo mais acesso ao público do que um longa comercial?


[1] Neto, Antonio Querina, “O Papa do Pop”, Revista Set, pág. 60.

 Listagem de filmes de Warhol

*Filmografia alternativa ou...

“Aqueles que andavam com o Andy eram todos uns idiotas drogados”, afirma Paul Morrissey que dirigiu todos estes filmes, “fiz os filmes para mostrar como eram estúpidos”. 
Sleep. 1963.

Mostra, em seis horas de duração, John Giorno, amigo de Warhol simplesmente dormindo... nas recentes exibições mantém a projeção a 16 quadros por segundo e são exibidos "apenas" 42 minutos de filme, que já é um delírio. Estética de Andy Warhol de que o olhar implacável da câmera pode romper comportamentos normais e forçar uma resposta específica;


Blow Job, 1963, 35 minutos, silencioso (o registro de um ato de sexo oral em que se vê apenas o primeiro plano de um jovem ator anônimo).

Kiss, 1963. com Baby Jane Holzer e Gerarde Malanga: dois dos novos superastros criados por Warhol mostra quase uma dúzia de pessoas, numa sucessão de beijos que dura 58 minutos.

Haircut, 1963.

Eat, 1963. 39 minutos silencioso (o ator e artista plástico Robert Indiana come meticulosamente um cogumelo frente à câmara, evocando retratos de santos feitos pelos pintores flamengos no século 15).

Empire, em 1964, warhol filma oito horas de um quadro parado do empire state building ele queria mostrar a "vida sob o olhar de um defunto".


Tarzan and Jane regained ... sort of, 1964

Dance movie/roller skate, 1964

Batman Dracula, 1964

Salome and Delilah, 1964

Soap opera, 1964 (co-dir.)

Couch 1964

13 most beautiful women, 1964

Harlot, 1964 "O grande filme, insuperável da carreira de Mario Montez, foi 'Harlot' de Warhol, em que ele faz uma loura (que seria uma fusão de Harlow e Marilyn; ‘harlot’ vem de Harlow) travestida, de luvas brancas, que come bananas todo o tempo, devagar, descascando-as de luvas brancas, num sofá claro que isso é uma descrição bem careta, que não é tudo; a última banana é enfiada no cu pela própria; Warhol fez 'harlot' em 1964, e se situa na sua obra como uma transição da fase de 'eat', 'sleep', 'Kiss', para a que culminaria com 'the chelsea girls'; vou lhe enviar um novo livro que saiu: Vida e sexo de Andy Warhol”. Trecho de carta de Hélio Oiticica para Torquato Neto, 18 jun. / 1971.

'The life of Juanita Castro' de 1965. 65 minutos, sonoro
(Sátira a Fidel, seu irmão Raul e Che Guevara são interpretados por mulheres).


Poor little rich girl, 1965

Screen test, 1965

Vinyl, 1965

Beauty #2, 1965

Horse, 1965

My hustler, 1965

Camp, 1965

Afternoon, 1965

Suicide, 1965

Drunk, 1965

Bitch, 1965

Prison, 1965

Space, 1965

The Closet, 1965

Henry Geldzahler, de 1965. 90 minutos, silencioso (o curador de arte nova-iorquino fuma um interminável charuto).


Taylor Mead's ass' (1965).


Face, 1966

Outer and inner space, 1966

The 14-year old girl/hedy/hedy the shoplifter, 1966

More milk Yvette/Lana Turner, 1966

The Velvet Underground and Nico, 1966

Kitchen, 1966

Lupe, 1966

Chelsea girls, de 1966, 210 minutos, sonoro
(Nova-iorquinos drogados e ensimesmados, viajando em seu próprio mundo, enquanto os Estados Unidos lutavam no Vietnã)

I'm a man, 1967

Bike boy, 1967

Nude restaurant, 1967

****/four stars/24-hour movie, 1967

The loves of Ondine, 1968

Flesh (1968 - produtor) ano da "aposentadoria" de Andy Warhol como cineasta underground neste ano, o artista sobreviveu a um atentado praticado pela feminista Valerie Solanas, que lhe desferiu três tiros foi assim que ela, que mantinha uma tempestuosa relação de amizade com Warhol, paradoxalmente garantiu seus 15 minutos de fama sua história virou o filme: "Um tiro para Andy Warhol" ("I shot Andy Warhol", Estados Unidos, 1996), longa de estréia de Mary Harron.

Lonesome cowboys, 1968

Blue movie/fuck, 1969


Trash, 1970 (producer)

Heat, 1972 (producer)

Women in revolt, 1972 (co.dir. with Paul Morrisey)

L'amour, 1973 (co.dir. and co-script with Morrisey)

Andy Warhol's Frankenstein/Flesh for Frankenstein, 1974 (producer).

Andy Warhol's Dracula/Blood for Dracula, 1974 (producer).

Underground and emigrants, 1976 (actor)

Andy Warhol's bad, 1977 (producer)

An unmarried woman, 1978 (art collab.)

Cocaine cowboys, 1979 (actor)

The Look, 1985 (actor)

Vamp, 1986 (contrib. art)

Superstar: The Life and Times of Andy Warhol, 1991 (documentary)

*Compilado e escrito por Mário Pacheco -
 
http://www.dopropriobolso.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=576:andy-warhol-uma-galeria-de-cineastas-underground&catid=51:cinema&Itemid=54

Um comentário:

  1. WARHOL... Para mim, ícone e grande influência fashion. estilo urban ...visual despojado e mega atual. Se é entediado ou não...depende de gosto. E a meu ver, o tédio é o esconderijo da mente psicodélica de todo o artista. na verdade eu diria que é diáfano...contemplativo , mas muito a frente do seu tempo. Beijão.Gostei das informações.

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