sábado, 1 de dezembro de 2018

RELATOS DE OFÍCIO - II



Nem só de fontes oficiais se faz o jornalismo. Muitas vezes cansa você ter que procurar aquela autoridade; aquele político;  aquele "entendido" oficial, com crachá, currículo embaixo do braço e "dez mil palavras de efeito".

O jornalismo real às vezes está em uma esquina. Em um boteco. Em uma fila de mercado ou num protesto conta a suba do gás. O verdadeiro jornalismo não escolhe hora, local ou sobrenome. 

Muitas pautas surgem de efemérides. Outras do telefone que toca na redação e alguém grita: "saiam da cadeira confortável, do uso tranquilo das redes sociais e dos press-release". Outras, nascem daquele olhar que o repórter insiste para o editor: "é preciso publicar, até porque a fonte ou o assunto são bem legais". E não é que o repórter consegue (às vezes convencer a chefia...).

Essa veio da minha paixão por sebos. Em Bagé tem apenas um que podemos chamar de "Sebo". Sim, com o S em caixa alta. É o do popular "Seu Severo". O dono da Cultura Som. Aquele estabelecimento que fica em uma das pequenas ruas do Calçadão, mas que contém um vasto acervo em livros e discos de vinil.

Confira, o texto publicado em 16 de novembro de 2012:

Uma casa que comercializa cultura e gera amizades








"Uma das melhores coisas da vida é ser feliz trabalhando no que se ama". Em um mundo que exige pressa, competitividade, símbolos de status e pujança acima de tudo, ouvir essa frase com tamanha ênfase, de um trabalhador proferida, é como ouvir uma canção rara.

É nesse tom, enquanto a manhã de primavera adentrava o seu estabelecimento, que o empresário João Severo ressaltava à reportagem do FOLHA do SUL sua história entre os livros, discos e demais artefatos culturais.

Severo é dono do mais tradicional sebo (e talvez o único) de Bagé e há 19 anos trabalha com cultura.  Seu ofício está ligado à paixão pelos sebos. Para quem não sabe, os sebos são os espaços onde se comercializam livros, revistas em quadrinhos, discos, e demais produtos usados que quase sempre são vendidos em locais frequentados por curiosos, estudiosos e colecionadores. No caso de João Severo sua paixão por colecionar almanaques e revistas em quadrinhos, os "gibis", o levava a frenquentar os sebos da cidade do Rio de Janeiro, quando morava na capital fluminense. "O carioca gosta de frequentar sebos e quando eu morava lá era o meu programa dos sábados. Havia bons sebos no Rio de Janeiro e em Porto Alegre eu também sempre buscava alguma coisa", disse.

Quando voltou a Bagé, Severo participou de um brique coletivo nos anos 80. Quando o brique acabou, ficou a vontade de prosseguir no negócio de compra, troca e venda de artigos culturais. Nascia assim a Cultura Som. "Foi o primeiro sebo da região e se mantém porque é necessário amor pelo negócio. Deve-se entender que o sebo tem um ritmo próprio. Os clientes são diferenciais, pois cada um tem uma personalidade e um gosto em especial, então com o tempo fiz diversos amigos que até hoje vêm aqui para garimpar alguma coisa", afirma João Severo. E ele tem razão. Há dois tipos de clientes num sebo. Existem os que vêm procurar algo em específico e àqueles que deixam-se perder por horas.

Para quem visita o estabelecimento de João Severo e tem tempo para buscar raridades, há diversas opções. São mais de mil livros e dez mil discos de vinil, fora o grande número de CD's, revistas em quadrinhos, coleções inteiras de gibis e seriados dos anos 40 e 50, entre outras raridades que ele comenta com entusiasmo à reportagem. "Tenho muito material raro em vinil, elepês do folclore argentino, uruguaio e de outros países da América Latina, como Cuba. Além disso, tenho discos de grupos japoneses raros".








Na área dos livros, Severo comenta que há desde obras populares como best sellers, até livros antigos de filosofia, sociologia, antropologia e demais obras científicas que são procuradas por diversos interessados.


"A melhor coisa daqui são as amizades que fiz por conta do sebo. Há clientes que eram adolescentes quando começaram a frequentar a loja e hoje já trazem seus filhos. Outros vêm todos os sábados enquanto as esposas estão fazendo compras em lojas, aí ficamos conversando e trocando informações. Muitas vezes prefiro vender um produto por um valor mais baixo para um colecionador do que vender para alguém que não tem o mesmo interesse pela obra em si. Eu entendo desse sentimento porque também sou um colecionador e então me realizo quando vejo que uma outra pessoa conseguiu adquirir aquele disco ou livro que tanto procurava", salienta João Severo.


 O sebo de João Severo fica na pequena rua Pelotas, em pleno Calçadão de Bagé. Naquele espaço de tantas obras raras ou populares, Severo segue sua trajetória de comercializar cultura para os bageenses e para os quem vêm de fora conhecer o único sebo da Rainha da Fronteira. Certamente, quem o visitar, verá um profissional extremamente feliz com seu negócio. "Minha felicidade é estar aqui trabalhando e fazendo amigos, na verdade as horas que passo aqui na loja são tão boas que nem encaro como um trabalho, mas sim como um lazer".




RELATOS DE OFÍCIO - I



Com mais de sete anos como repórter do jornal Folha do Sul, publiquei algumas reportagens que merecem ser guardadas neste humilde espaço. Textos que registraram aspectos históricos da cidade;  fatos que, ainda hoje, trazem repercussão e, principalmente, ganham nova luz quando revistos no tempo presente. Além disso, o ofício jornalístico faz com que as fontes, possam também ser reconhecidas como personagens "destaque", atores sociais que comprovam com seus atos, obras e discursos, a rica trajetória da cidade, bem como da região da Campanha, tanto para o Rio Grande do Sul quanto para o Brasil.

Para iniciar, que tal recordar do eclipse solar de 1966? Fato marcante que fez com que a cidade de Bagé recebesse a visita de cientistas de diversos países. Em 7 de novembro de 2012, publiquei matéria especial sobre esse fato, visto que na época, a Universidade Federal do Pampa faria uma exposição sobre o acontecido. Isso antes da instituição de ensino ter o planetário, um diferencial de nossa cidade. Dessa forma, vamos ao texto de 2012:






Exposição resgata fato histórico que ocorreu em Bagé nos anos 60


"Na metade da década de 60, um fato alterou a rotina da Rainha da Fronteira: o desembarque de cientistas de vários países que vieram observar um eclipse solar em Bagé. Isso porque o fenômeno, propagado como o último eclipse solar visto no continente sul americano no século XX, teve o município como um dos melhores locais para observar o acontecimento. O eclipse do sol pela lua ocorre de acordo com a distância da lua à terra durante o evento. Quando a Terra intercepta a porção da umbra da sombra da lua, ocorre um eclipse total do sol. Foi o que aconteceu em Bagé no dia 12 de novembro de 1966. O fato histórico motivou uma exposição que será apresentada de 12 a 23 de novembro na Casa de Cultura Pedro Wayne. Intitulada “Um Eclipse na História de Bagé", a exposição conta um pouco sobre a história do evento e discute a ciência por trás dos eclipses. A exposição integra o programa de extensão “Astronomia para Todos” da Universidade Federal do Pampa, coordenado pelo professor Guilherme Marranghello, em parceria com a Casa de Cultura Pedro Wayne e a Secretaria Municipal da Cultura.

Marranghello conta que a ideia surgiu porque desde o ano de 2009, ele trabalha com divulgação de ciências, especialmente da astronomia, em projetos financiados pela Unipampa, MEC e CNPq. “Recebi um material sobre este eclipse e, conversando com um colega historiador, o professor Alessandro Bica, resolvemos fazer uma busca maior no arquivo público.Veio então a proposta de organizarmos uma exposição”, relata. O professor informa à reportagem do jornal FOLHA do SUL, que a exposição contará com recortes dos jornais da época que trouxeram as notícias sobre o evento. “Também teremos na exposição algum material sobre a história da década de 60 e, é claro, algum conteúdo de astronomia”, ressalta Marranghello, explicando que o material que foi achado no Arquivo Público Municipal mostra uma série de eventos festivos para recepcionar os cientistas brasileiros e estrangeiros que aqui vieram, incluindo manifestações da cultura gaúcha. “Em contato com um dos pesquisadores que vieram até Bagé, o professor Pierre Kaufmann, este também se manifestou dizendo que a população bageense foi muito acolhedora”, comenta o professor.






Fatos curiosos

Perguntado se ocorreu algum fato curioso no dia do eclipse solar e que tenha repercutido na cidade, Marranghello destaca que foram tantos os fatos curiosos que não deu para incluí-los todos na exposição. “Como o eclipse obscureceu os céus de Bagé durante algum tempo, foi possível ver as galinhas se recolhendo ao seu galinheiro. Algumas pessoas, com medo daquele evento, se puseram a rezar, entre outros fatos pitorescos”, afirma.
O eclipse solar em Bagé foi um fato de grande importância para a ciência, garante o professor da Unipampa. “As pesquisas realizadas, por exemplo, pelo Kaufmann, foram esclarecedoras para compreender melhor alguns componentes da radiação proveniente do sol. Assim como as pesquisas conduzidas por pesquisadores brasileiros, as pesquisas estrangeiras também geraram novos conhecimentos, principalmente sobre o sol. Este evento também proporcionou um contato maior entre a comunidade bageense e temas ligados à astronomia, o que acaba instigando jovens à carreira científica e aos estudos de forma geral”.

Fenômenos como este são vistos, em sua totalidade, em uma faixa muito estreita do planeta, esclarece o professor. Não existe uma região ou local boa para ver todos os eclipses. Em 1966 por determinadas circunstâncias, o município de Bagé era a principal localização para observar o eclipse solar".

segunda-feira, 26 de novembro de 2018


EXPERIÊNCIAS >

O que aprendi sobre jornalismo com Flávio Tavares

Por Marcelo Pimenta em 07/03/2018 na edição 977

Observatório da Imprensa


Com fala tranquila e, precisa em cada argumento, o jornalista gaúcho Flávio Tavares explicou à turma de estudantes do curso de Comunicação Social da Universidade da Região da Campanha, em Bagé, os motivos e fatos que o levaram a ter uma trajetória tão vibrante e histórica no ofício jornalístico.
De Getúlio Vargas a Salvador Allende, de Brizola a Che Guevara; dos textos para a campanha da Legalidade aos relatos de quem fora banido do país pelo regime de exceção civil-militar, Flávio Tavares viu e participou ativamente da história nacional. O encontro aconteceu em novembro de 2004. Era uma sexta-feira quente, abafada, em que os escassos períodos de chuva, que logo se dissipavam, traziam apenas mais calor à cidade. Tavares chegou ao município após uma viagem de quatro horas de Porto Alegre até a chamada “Rainha da Fronteira”.
Ele havia lançado há alguns meses, o segundo livro, “O dia em que Getúlio matou Allende”. Obra que em pouco tempo se tornou uma das principais de 2004, assim como fora “Memórias do Esquecimento”, publicada cinco anos e que talvez tenha sido um dos mais sinceros, comoventes e vivos discursos contra as atrocidades perpetuadas por regimes ditatoriais. Ambos os livros foram aclamados pela crítica e renderam prêmios Jabutis a Tavares. Em virtude da publicação, o jornalista de Lajeado estava, naquele momento, viajando pelo Brasil para participar de conferências, seminários, feiras literárias e outros eventos, divulgando sua recém-lançada obra.
Em Bagé, sua presença encerrou as atividades da programação da semana acadêmica do curso de Comunicação Social daquele ano. Tavares veio de carro com o diretor do curso e, pelo caminho, notava que o Pampa não era mais o mesmo. “Como plantaram eucaliptos e acácias. Isso não tem nada de relação com a vegetação nativa dessa região”, comentou sobre a expansão da silvicultura após políticas estaduais de incentivo à atividade, tomadas no final da década de 90, o que fez com que muitos produtores rurais abandonassem a centenária produção pecuária, pelo plantio de árvores exóticas àquele ambiente.
Chegando ao local da palestra, o jornalista atendeu ao público e autografou alguns exemplares dos dois livros. Concedeu entrevistas aos veículos de imprensa local. Para o já extinto jornal Correio do Sul (veículo que funcionou de 1914-2008), ele destacou ao repórter Paulo Fontes, que os militares brasileiros precisavam assumir publicamente os delitos e crimes cometidos, na maioria, em nome do exercício da democracia. Sobre sua atuação em grupos de guerrilha, ele destacou a inexperiência dos que, como ele, lutaram para transformar o país naquele contexto. Da dor vivenciada nos porões da ditadura, Tavares frisou ao impresso: “pois aqueles que conseguiram sobreviver as prisões e torturas do período da ditadura, como eu, se tornaram melhores, menos rígidos”. Já ao jornal Minuano, periódico ainda em atividade em Bagé, Tavares ressaltou: “Aproveitem, procurem viver a liberdade. Precisamos participar da realidade do país”, frisou o jornalista que se declarou um “socialista com amor cristão”.
Em sua palestra, os jovens acadêmicos participaram ativamente do evento, perguntando acerca de temas relacionados ao passado, como censura à imprensa, ditadura militar, bem como pautas atuais, naquele período, como a política de globalização norte-americana pós-atentados de 2001; governo Lula, um ano do apogeu do escândalo do mensalão e a discutida abertura dos arquivos militares durante o regime de 1964-1985.
Cortês, após a palestra participou de um jantar com a equipe do diretório acadêmico, o qual eu fazia parte. Lá, ele ouvia cada relato dos jovens estudantes sobre as dificuldades para ingresso no mercado profissional, como os dilemas típicos de quem ainda não sabe precisamente qual será o caminho após a graduação. Falava ternamente sobre os novos rumos do jornalismo com o avanço da internet e, de forma sincera, também recordava os inúmeros temores que já havia enfrentado e superado em sua longa carreira. Naquele momento, era o professor acadêmico Flávio Tavares que nos dava uma aula informal, logo ele, de tamanha expressão como professor da UNB.
No outro dia, antes de retornar à capital gaúcha, Flávio Tavares quis revisitar alguns locais de Bagé. De forma humilde pediu que o conduzíssemos pela cidade para conhecer alguns pontos históricos daquela Bagé de fronteira com o Uruguai, de forte presença militar e que, ironicamente, era berço do terceiro presidente da ditadura militar, Emílio Garrastazu Médici. Também quis conhecer a universidade em que estudávamos. Na sede do Diretório Acadêmico brincou ao ver o pôster de Che Guevara que estampava uma das paredes do espaço. A mítica imagem do argentino captada por Alberto Korda o fez relembrar dos momentos de convívio com o guerrilheiro na Conferência Internacional que ocorrera em 1961, em Punta del Este, no Uruguai. “Che sempre saí bem na foto!”, disse. Dessa relação com Che, publicou três obras ao longo dos anos: “O Che Guevara que conheci e retratei” (2007); “Meus 13 dias com Che Guevara” (2013) e “As três mortes de Che Guevara” (2017).
Aos nos despedirmos, uma estranha sensação acometeu àqueles jovens estudantes. Em menos de 24 horas de convívio, aprendemos lições que ficariam vivas por todos esses anos. Alguns dos ensinamentos concedidos pelo “colega mais velho”, como ele nos dizia, mantêm-se ativos em cada um dos três estudantes de jornalismo. Eu, Ary Silva e Sidimar Rostan, iríamos nos formar e prosseguir com estudos e trabalhos voltados à imprensa, sem esquecer de cada indicação dada por Tavares, no que se refere às ações jornalísticas, das fontes aos leitores, e em especial, do elemento transformador de vidas e sociedades que é a informação.
O convívio daquele encontro em novembro, permaneceu por contatos feitos pela internet. Certa vez, ao indagar de como estávamos e sobre o que estávamos produzindo, ele manifestou apreço: “Com vocês aprendi que a juventude pode ser adulta e séria, sem perder a ternura juvenil jamais! Os moços sérios são ainda mais moços!”, reiterou em uma das “cartas pela internet”, como ele se referia à nossa comunicação.
Anos depois, eu o indaguei em entrevista concedida ao jornal Folha do Sul, em reportagem sobre os 50 anos do golpe militar, de como era produzir e divulgar informações em um período de tamanha restrição como o vivido após 1964. E Flávio Tavares respondeu: “Toda opressão sempre leva a que busquemos formas mais inteligentes para escrever ou nos comunicarmos. Assim, fomos obrigados a escrever melhor, recorrendo a sutilezas, imagens e metáforas, para tentar ludibriar os censores que nos oprimiam. Mas prefiro que não tivéssemos sido obrigados, todos nós, a buscar formas mais inteligentes e sutis, como o fizeram Chico Buarque e tantos outros. Preferiria que continuássemos burros mas com plena liberdade de pesquisar, escrever ou compor canções. A liberdade de criar é insubstituível. É como o oxigênio que respiramos”, ensinou mais uma vez a este jovem colega. Obrigado professor!
**
Marcelo Pimenta e Silva é jornalista.













Ora, há quanto tempo não havia poesia e sinergia entre corpo e espírito
não tente me falar que isso é fácil de ser fabricado,
talvez o senhor nunca tenha visto
como a lua fica, tão bela,
quanto está
grávida.

sentimento.

para muitos é apenas desperdício de energia...

tenho amigos que fantasio como inimigos,
apenas para poder confabular

profetizar

que hoje,
sou o inimigo.
que hoje,
 apenas hoje,
 sou este,
que vos digere (e vomita)
Expurga
como mal
como aquilo
que me desconfigura
como homem

Não!

eu apenas escrevo
porque preciso respirar.

não quero aplausos
não quero assovios
quero o silêncio da ribalta
o morder dos dentes
os olhares sem fixar,
horizonte algum.

quero a verdade
apenas aquela que marca a pele
feito tatuagem...

e que diagnostica em cada pele
uma identidade própria
um terço sufocado,
uma oração violentada

por gracejos publicitários

afinal,
amanhã, será outro dia!
E agora,

para que todos saibam
novas linhas
novas cicatrizes


eu tatuarei.


















Depois de tanto tempo,
no limbo da labuta,,,enquanto mil escravos mudavam a história.
Eu também me seduzi pela ilusão.
Ah, eu também escolhi o "messias" do povo. E desde os anos 90, o defendi... Mas a vida demonstra o quanto somos estúpidos.
Agora, com raiva desses cachorros amestrados. Cá estou! Como Jason, renascido. Pronto para escrever...mal traçadas linhas para ninguém ler.